Água de Beber: engarrafada? da torneira? e que mais…

agua

“A água é a força motriz de toda a natureza.” Leonardo da Vinci

 

 

 

 

 

As vendas anuais de água engarrafada atingem 11 mil milhões de dólares, sendo este número apenas referente aos E.U.A.. Sem dúvida um negócio impressionante! Mais impressionante ainda se tivermos em conta que temos acesso a água potável nas nossas casas… Neste contexto, o já reconhecido projeto Story of Stuff revela num filme de 8 minutos – A História da Água Engarrafada http://www.youtube.com/watch?v=7MB2ETA5wto&feature=related – como as campanhas massivas de marketing podem convencer milhões de pessoas a comprarem um bem a um preço exorbitante quando este já se encontra disponível nas redes públicas. O filme descreve também o processo de ataque da indústria de água engarrafada à água da torneira e todo o marketing floreado para encobrir as montanhas de lixo plástico que esta indústria produz (!).Na mesma linha, o documentário Tapped – 2009 de Stephanie Soechtig & Jason Lindsey – examina o impacto da indústria de água engarrafada na saúde pública, na poluição, na mudança climática e na nossa dependência do petróleo. Estamos perante uma moda que implica o consumo anual de 17 milhões de barris de petróleo para a produção das garrafas PET, e isto apenas para os E.U.A. onde se consomem 51 mil milhões de garrafas de água por ano. Segundo as estimativas, somente 22% destas garrafas são recicladas terminando o restante nas lixeiras e grande parte diretamente no ambiente, incluindo o mar. A nível mundial, calcula-se que a indústria da água engarrafada produza cerca de 2.7 milhões de toneladas de plástico por ano. Ao impacto ambiental dos recipientes de plástico soma-se o impacto ambiental da poluição derivada de todo o processo de embalagem e transporte da água até ao seu local de consumo. Além disso, a água engarrafada é vendida a um preço exorbitante. De facto, a grande percentagem do dinheiro que se paga vai para o engarrafamento, embalagem, distribuição e lucro. Não se paga a água como bem, mas paga-se sim a indústria.

 

A maioria das águas é embalada em garrafas de plástico PET (politereftalato de etileno). Se bem que segundo a Diretiva 2009/54/EC da União Europeia “os recipientes devem ser tratados ou fabricados de maneira a evitar que as características microbiológicas e químicas das águas minerais naturais não sejam alteradas” certos elementos químicos tóxicos que fazem parte do plástico PET (ex. antimónio, bisfenol A, acetaldeído) passam para a água. Alguns destes elementos são libertados para a água em especial quando a garrafa é exposta ao calor (nunca se deve beber a água de uma garrafa de plástico que tenha ficado dentro do carro num dia de calor) mas outros não necessitam de temperaturas elevadas ou de exposição a radiação UV. Além disso, o uso repetido das garrafas de plástico PET aumenta o grau de libertação dos químicos tóxicos para a água. Em consequência, nalgumas garrafas já se pode ler o aviso “ proteger da luz e calor” e “para sua segurança não reusar esta embalagem”. A partir de determinadas doses, certos tóxicos que fazem parte da composição do PET são associados a uma disrupção a nível do sistema hormonal e podem estar na origem de certos tipos de cancro. Assim, as investigações sobre o impacto do uso de garrafas de plástico na saúde pública prosseguem (Bach et al., 2012).

 

São inúmeras as campanhas contra o uso de água engarrafada. Nos E.U.A. a campanha “Ban the Bottle” tem uma página web atualizada sobre as consequências do uso de água engarrafada, as estatísticas, as suas ações em campo e outras informações (em inglês: http://www.banthebottle.net/ ). Também nos E.U.A., no Parque Natural do Grande Canyon, foi proibida a venda de água engarrafada devido à elevada quantidade de garrafas de plástico espalhadas que arruinavam aquela grandiosa paisagem natural. Como opção, cada visitante tem agora inúmeros locais de abastecimento onde pode encher as suas próprias garrafas com água. Afinal, não é assim tão difícil mudar as coisas…Em Portugal, as campanhas para o uso de água da torneira são muitas vezes organizadas pelas Entidades Gestoras de sistemas de abastecimento de água e contam-se já várias destas ações por todo o país com sessões de divulgação, esclarecimento e campanhas publicitárias (ex. o projeto “Beba água da torneira” pelos SMAS de Almada, “Cientistas da Água” pelas Águas do Ribatejo, “Beba água da torneira, poupe no presente e proteja o futuro” pelas Águas de Gaia). Mas a nossa Assembleia da República não quer aderir a esta prática e as desculpas vão desde que a água da torneira não é de qualidade, de que não existem jarros suficientes nem pessoas para os substituir porque os deputados não entendem onde poderiam ir buscar água (que tal cada um levar um copo de vidro de casa e levantaram-se para ir buscar a sua água a máquinas de abastecimento de água que podem ser espalhadas por lá?!!), e, também, como os nossos políticos se preocupam muito acerca das suas despesas para o país: que o preços dos jarros e das pessoas para os substituir seria mais caro que a água da garrafa (não sei se nesta conta incluíram o reconhecido impacto ambiental ou se as contas foram feitas de um modo tao básico e linear como o raciocínio que as gerou…) e, também, porque “temos tanto para nos ocupar”. A proposta seguinte, devido à extrema “dificuldade” de substituir as garrafas por água da torneira (…!) é que se passe a adquirir água em garrafas de vidro reutilizáveis (Garcia & Ferreira, 2012). Vamos a ver quais serão as dificuldades apontadas para a implementação desta proposta… É reconfortante viver num país em que os governantes possuem um modo de vida “tão exemplar” … palavras para quê…

 

Estima-se que nos E.U.A. 1/3 da água engarrafada seja água da torneira já que a sua origem – e também tratamento – não se encontra devidamente legislado. Por cá temos uma regulamentação mais apertada. Na União Europeia, segundo a Diretiva 2009/54/EC (JOUE, 2009) relativa à exploração e à comercialização de águas minerais naturais, na rotulagem das águas minerais deve constar o local de exploração e a sua nascente, a sua composição analítica incluindo os componentes característicos e também os tratamentos autorizados que foram efetuados. De facto, as águas minerais não podem ser purificadas antes da sua comercialização a não ser para separação de elementos instáveis (ex. compostos de ferro e enxofre) e para a regulação da quantidade de gás carbónico livre. Outro tipo de tratamento (ex. separação de componentes indesejáveis) requer uma notificação e autorização específica. A desinfeção é proibida já que a água da fonte já deve se encontrar livre de contaminação biológica (microrganismos patogénicos e outros) e a quantidade de colónias de microflora presente na água engarrafada deve restringir-se ao aumento natural da quantidade de bactérias presente inicialmente na água. No entanto, a microflora que continua a crescer dentro da água depois de engarrafada foi estudada por modernos métodos de identificação concluindo-se que esta flora bacteriana é mais diversa do que o que se pensava restando clarificar se alguns destes microrganismos podem ter efeitos nocivos sobre a nossa saúde (Loy et al., 2005).

 

A crença de que todas as águas minerais naturais engarrafadas são saudáveis para o organismo pode nem sempre corresponder à verdade. Uma água demasiado rica em certos minerais pode sobrecarregar os rins e não deve ser, como tal, consumida a longo prazo por pessoas com os rins comprometidos. Assim, o potencial benefício de uma água mineral vai depender da sua composição específica e também da constituição de cada pessoa. Por exemplo, um estudo recente concluiu que para uma água mineral promover a saúde dos ossos esta deve ter uma composição ideal rica em cálcio e bicarbonato e baixa em sulfato (Wynn et al., 2009).

 

Com base nas informações expostas, seria uma boa ideia limitar o consumo de água engarrafada para situações específicas, como, por exemplo, quando o acesso a água potável é restringido – como nos casos de cortes no abastecimento de água – ou durante uma viagem a países em que a qualidade de água é duvidosa. Para quem ainda assim prefere a água engarrafada, sugere-se:

– Usar preferencialmente água engarrafada em vidro devido ao desastroso impacto ambiental procedente do plástico das garrafas e, também, devido ao potencial impacto na saúde devido à libertação de tóxicos do plástico para a água. O ideal seriam garrafas de vidro com retorno mediante uma tara, como nos velhos tempos, já que, a própria reciclagem das garrafas de vidro também envolve gasto de energia e contaminação ambiental. De recordar que, sempre que possível, se deve Reusar antes de Reciclar.

– Não usar a mesma marca de água mineral a longo prazo, mudando de tipo de água com frequência para evitar possíveis danos ao organismo por excesso de certos minerais.

Aqui fica também uma chamada de atenção para as empresas que possuem um serviço de distribuição de água em garrafões de grande quantidade que poderiam começar a adotar a solução de cada trabalhador levar o seu copo de vidro em vez da ridícula mania de beberem dois golos e jogarem o copo de plástico fora. Este tipo de atitude irrefletida causa sérios danos no ambiente (mais copos de plástico) que podem ser facilmente evitados.

 

Quanto à qualidade da água da rede pública. Em Portugal, a qualidade da água para consumo humano é regida pelo Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto (DR, 2007). A ERSAR (Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos) “é atualmente a autoridade reguladora dos serviços de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos e a autoridade competente para a qualidade da água para consumo humano” (http://www.ersar.pt ). Num estudo da Deco – Proteste em que se recolheram dados da qualidade de água de 50 localidades portuguesas referentes a 2004 – 2005 concluiu-se que “embora, de um modo geral, a água consumida em Portugal seja de qualidade, ainda há localidades onde persistem problemas de contaminação” (Proteste, 2006). Os principais problemas foram encontrados no interior norte em zonas de baixa densidade populacional e referiam-se a contaminação bacteriológica e um valor excessivo de ferro, arsénio, manganês e alumínio. Também foram encontradas noutras zonas cloratos, cloritos, micobactérias e endotoxinas. Mais recentemente, a ERSAR afirmou que os incumprimentos registados na qualidade da água não chegam a atingir 2% das análises feitas em todo o Portugal e que estes “não têm impacto na saúde humana”.

 

A água da torneira contém desinfetantes (ex. cloro) e subprodutos da desinfeção (ex. trihalometanos, ácidos haloacéticos, compostos orgânicos voláteis). Estes últimos podem ser nocivos para a saúde conforme a quantidade presente na água. Também, se a água é corrosiva ou em casas mais antigas que possuam canalização de chumbo, a água pode veicular contaminantes como traços de metais pesados (ex. chumbo). Outros fatores que podem alterar as características da água incluem o estado de conservação de hidropressores de um prédio e a temperatura da água (ao retirar água quente de uma canalização de chumbo arrasta-se para a água traços deste metal pesado). Recorde que as análises laboratoriais de qualidade da sua água podem ser consultadas. Para saber onde pode ter acesso aos resultados das análises trimestrais contacte com a sua Entidade Gestora de sistemas de abastecimento de água já que a comunicação destes resultados é obrigatória.

 

Existem no mercado vários sistemas de purificação de água para uso doméstico, desde os mais simples jarros com filtros de carbono ativado, a sistemas de osmose inversa que requerem uma instalação. O método selecionado vai depender de quais os contaminantes a reduzir na água, da quantidade de água que usa por dia e o custo do sistema selecionado (inicial de e de manutenção). Por exemplo, os sistemas de carvão ativado são úteis se a água fornecida não contém contaminantes de maior e se os contaminantes presentes são reduzidos por este sistema. Cada método de purificação tem os seus pros e contras. Para ter uma ideia sobre os diferentes sistemas de purificação de água, seguem algumas características gerais de alguns filtros. No entanto, cada sistema certificado deve indicar em detalhe quais as substâncias que filtra.

 

Filtro Contaminantes reduzidos Observações
Carvão AtivadoGranulado Cloro,  alguns metais (ex. chumbo e cobre). Alguns também filtram pesticidas, medicamentos, benzeno, Trihalometanos (THM), policlorobifenilos (PCB). Filtra menos substâncias que outros sistemas. Certas substâncias podem atravessar os grânulos de carbono sem serem filtradas.
Carvão Ativadoem Bloco

(Carbonit)

Por estar compactado, este tipo de filtro impede o desenvolvimento de microrganismos. Qualidade superior ao anterior. Uma boa opção para quem recebe água da torneira que não esteja muito contaminada.
Osmose Inversa Filtra o mesmo que o carvão ativado +fluoretos, arsénico, boro, cádmio, cobre, cálcio, cromo, prata, manganês, mercúrio, sulfatos, cloretos, sódio, selénio, zinco, estroncio 90, radio 226 y 228, tanino, microalgas, bactérias e fungos.

Nem todos eliminam nitratos.

Desperdiça água já que para obter 1 litro de água é necessário filtrar 4 litros.  Pode ser caro. Retira certos minerais da água o que obriga a necessidade de remineralizar a água de modo a ficar adequada para consumo.
Destilação Filtra o mesmo que a osmose inversa eferro, nitratos, sulfuretos e fluoretos. Gasta eletricidade e é moroso. A usar em regiões especificas ou certas águas de poços. Requer remineralização da água após destilação já que os minerais saudáveis também são removidos. Na falta deste passo, o seu uso a longo prazo pode causar problemas de saúde já que retira minerais do organismo.
UV Só reduz contaminantes biológicos (ex. microalgas, bactérias, vírus). Tem de ser usado em complemento com outro purificador de água em caso de contaminantes químicos.

 

Fica a chamada de atenção da ERSAR e da Associação Portuguesa de Distribuição e Drenagem de Águas (APDA) para o marketing agressivo e demonstrações fraudulentas que certas companhias de sistemas de purificação de água andam a exercer pelo país de modo a aumentar as suas vendas. Em questão estão sistemas de purificação de osmose inversa ou permuta iónica, que apenas devem ser usados em casos de contaminações mais graves já que também retiram minerais da água que são importantes para a nossa saúde (ex. cálcio, ferro, magnésio, sódio e potássio) e, como tal, devem implicar uma remineralização da água após a purificação de modo a ficar adequada para o consumo humano (ver tabela acima).Recorde que, conforme os resultados das análises de água, pode não necessitar de um sistema de purificação de água ou apenas um mais simples (ex. carvão ativado granulado). Por exemplo, na presença de sabor a cloro os técnicos aconselham a deixar a água num jarro para que o cloro evapore, após o qual a água recupera o seu sabor normal sem qualquer consequência para a saúde.

 

Em relação ao modo como pode transportar a água consigo, aconselha-se a aquisição de uma garrafa de água reutilizável que permita uma lavagem fácil (com água quente e esfregão para garrafas). Existem à venda pequenas garrafas de inox semelhantes aos cantis de antigamente. Assim como o vidro, o inox não lança contaminantes para a água e tem a vantagem de não se quebrar. Como opção, pode usar uma garrafa de vidro com um protetor à volta.

 

Aqui ficou um a base informativa para explorar melhor este tema tão atual quanto controverso.

Sabemos que a Água é a força motriz de toda a Natureza, incluindo a do nosso organismo. Vamos contribuir para Não FAÇAM desta força motriz uma força destruidora!

 

Maktub

 

Sofia Loureiro

Autora:
Guia de Remédios Naturais para Crianças
Guia de Remédios Naturais para Mulheres
Guía de Remedios Naturales para Niños

FACEBOOK: Guia de Remédios Naturais

BLOG: SoPro Verde

GOODREADS (perfil de autora): Sofia Loureiro

Terapeuta Natural  & Escritora
Lic: Biotecnologia
Doutoramento: Química do Ambiente
Formação em Terapias Naturais

Foto: water

Referências e mais:

Página oficial do documentário Tapped (em inglês) : http://www.tappedthemovie.com/

 

Bach, C et al., 2012. Chemical migration in drinking water stored in polyethylene terephthalate (PET) bottles: a source of controversy. Water Res. 46, 571-583.

DR, 2007. Decreto-Lei n.º 306/2007 de 27 de Agosto. DR 164, 5747-5765

Garcia, R., Ferreira, N., 2012. Parlamento rejeita beber água da torneira porque sai dez vezes mais cara. Público Fev2012

JOUE, 2009. Directiva 2009/54/CE do Parlmento Europeu e do Conselho de 18 de Junho de 2009 relativa à exploração e à comercialização de águas minerais naturais. L 164,45-58 http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:L:2009:164:0045:0058:PT:PDF

Loy, A., et al., 2005. Diversity of Bacteria Growing in Natural Mineral Water after Bottling. Appl. Environ. Microbiol. 71, 3624-3632

Proteste, 2006. Água da torneira: mais qualidade, menos desperdício. Deco – Proteste 267,8-13 http://www.deco.proteste.pt/agua/agua-da-torneira-mais-qualidade-menos-desperdicio-s410991.htm

Wynn, E., et al., 2009. The composition of mineral waters sourced from Europe and North America in respect to bone health: composition of mineral water optimal for bone. Br. J. Nutr. 101,1195-1199

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